sábado, 23 de junho de 2007


"Os botânicos podem soar agradavelmente arcaicos ou irritantemente pomposos. Podem conhecer o nome comum de uma flor, uma margarida, mas, em vez disso, dizem Asteraceae. Adoram o som desagradável do latim e competem pelo prémio do mais fluente. Aquilo é uma Melampodium leucanthum? Um Chrysanthemum leucanthemum? Uma Monoptilon bellioides? Uma Bellis perennis?
Não, não é uma Eregeron divergens?
Os adultos conversam. As crianças são excluídas.
"É uma margarida", murmura uma pessoa laica, entre dentes.
Na taxonomia tradicional, a margarida pertence ao reino Plantae, na divisão Angiospermophyta, na classe Dicotyledonaeae, na ordem Asterales e na família Asteraceae, na qual existem mais de mil géneros. Estes géneros contêm cerca de dezanove mil espécies. Cada agrupamento (reino, divisão, classe) é um taxon, cujo plural é taxa.
Os taxonomistas são pessoas que agrupam umas coisas com outras. Os taxonomistas pertencem ao reino Animalia, no filo Chordata, na classe Vertebrata, na ordem Primata, na família Homonoidea, no género Homo, no qula resta apenas uma espécie viva, sapiens.
O taxonomista repreende a pessoa laica: há margaridas a mais no mundo. Temos que ser mais específicos.(...)

As palavras, que a princípio chocam e estalam na nossa boca, hão-de ganhar suavidade rapidamente, como pedras sendo suavizadas pela água de um ribeiro, dando trambolhões, virando-se, pesando de história, repentinamente leves.
Melampodium leucanthum. Bellis perenis.
Você também se pode juntar à conversa.
Você também se sentirá especial.(...)

Queremos conhecer a margarida ao nomeá-la. Então, a coisa toda descamba como uma bola de neve. Queremos saber os nomes dos parentes da margarida e os nomes das plantas relacionadas com essas plantas e os nomes das plantas relacionadas com estas últimas e percebemos que queremos dar nome ao mundo inteiro.
A margarida é uma pequena parcela do que os botânicos chamam árvore da vida. Queremos conhecer a árvore da vida.
É mais do que encontrar uma linguagem comum, é mais do que ter uma conversa. É sobre como todos os nomes se começam a ligar e a interagir, como as palavras tomam forma de algo maior, como o crescimento celular da própria planta, florescendo em ramos e folhas, como um abraço de tudo o que está vivo na terra."

ANATOMIA DE UMA ROSA

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